"Precisamos promover o enfrentamento e a desconstrução do racismo no sistema de justiça, a fim de garantir uma sociedade justa e solidária". Essa foi uma das reflexões do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Benedito Gonçalves, na sua palestra proferida no primeiro painel jurídico da Semana de Arte e Sabedoria Jurídica Negra (Sabawona), aberta nesta segunda-feira (4), no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), iniciativa do Comitê de Igualdade Racial e da Escola Judicial (Ejug). O ministro abordou o tema  "Racismo Estrutural e Manifestações no Sistema de Justiça: como promover o enfrentamento e desconstrução".  


Na oportunidade, o vice-presidente do TJGO, desembargador Amaral Wilson, representou o chefe do Poder Judiciário, desembargador Carlos França. Já o diretor da Escola Judicial (Ejug), desembargador Jeronymo Pedro Villas Boas, mediou o painel, que foi transmitido ao vivo pelo canal da Ejug no Youtube. A mesa diretiva do evento contou ainda com a presença da vice-diretora da Ejug, desembargadora Alice Teles de Oliveira;  da vice-coordenadora da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar, desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis; e da coordenadora do Comitê de Igualdade Racial do TJGO, a juíza Adriana Maria dos Santos Queiroz de Oliveira.  



O vice-presidente do TJGO, desembargador Amaral Wilson, destacou a importância do papel de qualificação e aprimoramento de conhecimento oferecido pela Ejug. "O exemplo desse aprimoramento é a presença do  ministro Benedito Gonçalves, que tem  um currículo que dispensa comentários, é conhecedor do direito e do tema, quer em extensão e em profundidade, e que hoje nos brinda com a explanação do tema racismo estrutural e manifestações no sistema de justiça".



A coordenadora do Comitê de Igualdade Racial do TJGO, a juíza Adriana Maria dos Santos Queiroz de Oliveira fez uma breve apresentação da trajetória do ministro Benedito Gonçalves e reforçou a honra de tê-lo como palestrante na  Semana de Arte e Sabedoria Jurídica Negra do TJGO. "Como magistrada negra tenho o senhor como uma grande referência dentro do sistema de justiça. Não somente eu, mas como todas as pessoas negras que infelizmente são minoria dentro do Poder Judiciário e de outros segmentos da justiça, e se sentem engrandecidas com sua presença".



Racismo estrutural é disfarçado

O ministro Benedito Gonçalves pontuou que o racismo estrutural é um conjunto de práticas e crenças que perpetuam a desigualdade racial de forma sistemática, afetando todas as esferas da vida das pessoas negras. E reforçou que "o sistema de justiça não escapa dessa realidade. E é muitas vezes um dos principais palcos onde o racismo se manifesta de maneira cruel e desproporcional", observou, ao ressaltar que o racismo estrutural é aquele que nem parece racismo, é disfarçado. "É aquele que o ofendido sente a dor da discriminação e o ofensor diz, simplesmente, foi mal, você é preto de alma branca".



Benedito Gonçalves exemplificou essa realidade discriminatória e racista citando  números do Atlas da Violência de 2021, elaborado pelo Ipea. "A chance de um negro ser assassinado é 2,6 vezes superior a de uma pessoa não negra. Além disso, o sistema carcerário é o reflexo gritante da desigualdade racial. A população carcerária brasileira é majoritariamente negra, chegando a mais de 60%. Esses dados mostram que o racismo está impregnado nas estruturas e práticas do sistema de justiça, levando a criminalização e marginalização das pessoas pretas".



Desconstrução

Para garantir um sistema de justiça mais justo e solidário, o ministro afirma que é necessário promover o enfrentamento e a desconstrução do racismo. "Uma das primeiras medidas que devemos adotar é capacitação e sensibilização dos profissionais que atuam no sistema de justiça. É fundamental que juízes, promotores, defensores públicos, advogados e demais profissionais sejam adequadamente orientados sobre o racismo estrutural, suas formas de manifestação e os mecanismos para identificá-lo e combatê-lo", salientou Benedito Gonçalves.

Educação é a base

O diretor da Ejug, desembargador Jeronymo Villas Boas, agradeceu a presença do ministro, destacando sua capacidade jurídica, sua qualidade como julgador humano e como profundo conhecedor do tema. O desembargador também ressaltou que a educação é o melhor caminho para se combater o racismo. "Não adianta mais esconder o racismo debaixo do tapete e dizer que não existe, porque é reproduzido ideologicamente em nossa sociedade e nós só vamos obter um resultado efetivo contra o racismo pela  educação", enfatizou.



Na oportunidade, o diretor da Ejug convidou  a juíza Erika Barbosa Gomes Cavalcante, titular da Vara Criminal da comarca de Goiás e idealizadora do  Projeto Roda Antirracista no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Goiás, para que falasse  sobre a iniciativa, que consiste em um conjunto de ações educativas e culturais que visam discutir e promover a democracia racial, por intermédio do diálogo com a sociedade civil e atores do sistema da justiça.



No final do evento, o ministro Benedito Gonçalves foi homenageado com a comenda Mérito Acadêmico Professor Byron Seabra Guimarães.



Presenças

Também participaram do painel jurídico, a desembargadora Ana Cristina Peternella França; as juízas substitutas em segundo grau, Sirlei Martins, Roberta Nasser Leoni, Viviane Silva de Moraes Azevedo; e a juíza auxiliar da presidência, Lídia Souza. O painel teve a contribuição dos intérpretes de libras, Vinícius Melo e Ícaro Santos. (Texto: Karinthia Wanderley – fotos: Wagner Soares)

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