O juiz Eduardo Walmory Sanches, da 1ª Vara Cível da comarca de Anápolis, condenou um cirurgião plástico a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 30 mil e dano estético em R$ 20 mil, por ter deixado grandes cicatrizes em uma paciente após a realização de duas cirurgias. Para o magistrado, o médico não celebrou contrato por escrito de prestação de serviço e não orientou a paciente de forma adequada e necessária.
Consta dos autos que a mulher adquiriu gordura localizada e flacidez no abdômen, motivo pelo qual decidiu fazer a cirurgia plástica. Após consulta e valor acordado entre ela e o médico,a paciente já agendou o procedimento, que foi realizado em julho de 2013. No entanto, passado alguns dias depois da cirurgia, a mulher ficou preocupada pois as dores aumentaram e começou a sentir mal cheiro, apesar de tomar todos os remédios indicados pelo médico.
Mesmo seguindo à risca as orientações do médico, não obteve melhora. Ela deslocava-se diariamente ao médico durante seis meses para fazer os curativos na ferida que não queria cicatrizar. As cicatrizes, que permanecem até hoje, foram se formando a ponto de desconfigurar totalmente sua aparência. Diante da situação, ela procurou o médico, que sugeriu que ela colocasse prótese mamária, o que, segundo ela, na promessa que iria refazer a cirurgia na região abaixo do abdômen com a finalidade de retirar as cicatrizes. Ela refez a cirurgia em janeiro de 2014, e, não diferente da primeira cirurgia, a mulher ficou com uma enorme cicatriz entre os seios e sobre essa cicatriz criou-se uma pele, unindo os seios, e, ao refazer a cirurgia na região do abdômen, não obteve êxito novamente.
Diante dos fatos, o juiz observou que o réu presta serviço como médico cirurgião plástico. Portanto, sua obrigação é de resultado, afirmou o magistrado. Eduardo Sanches destacou que os artigos 8º e 9º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) se aplicam à sua especialização profissional. O réu, segundo ele, tem o dever de informar ostensivamente ao consumidor o perigo que o serviço a ser prestado pode causar. “A pedra de toque na conclusão do processo reside na ausência de informação necessária, expressa, ostensiva e adequada sobre as cicatrizes que o tipo de serviço prestado pelo réu poderia causar no consumidor (parte autora)”, salientou.
O magistrado salientou ainda que a leitura das provas documentais apresentadas pelo réu indicam a ausência de contrato por escrito de prestação de serviço com o respeito aos artigos 8º e 9º do CDC. De acordo com ele, o réu apresentou apenas termo de consentimento para realização de procedimento cirúrgico com cláusulas genéricas e que não informam adequada e ostensivamente sobre o perigo das cicatrizes que o tipo de serviço a ser executado poderia causar no consumidor.
“Cumpre, outrossim, salientar que apesar do laudo pericial judicial informar que a conduta técnica, a ciência empregada no procedimento cirúrgico pelo réu estar correta, o dever de indenizar o consumidor existe em razão da ofensa aos artigos 8º e 9º, do CDC (direito a informação necessária e adequada apresentado de forma ostensiva e explícita. Proibição de informação genérica)”, pontuou.
O juiz afirmou que recomenda-se a todo profissional da cirurgia plástica, em especial da abdominoplastia, que faça por escrito um contrato de prestação de serviço e de forma ostensiva, específica e direta, faça a advertência que aquele serviço que será prestado é potencialmente perigoso e que cicatrizes poderão surgir na pele do consumidor, não havendo como o médico prever tal situação. Ele verificou a presença do nexo de causalidade entre a falta de informação necessária e adequada ao consumidor, em especial em relação ao surgimento das cicatrizes provenientes do serviço prestado potencialmente perigoso, e o dano estético e moral suportado pela paciente.
Contratação de seguro para trabalhar
Na sentença, o magistrado destacou a falta de respeito e o preconceito com as mulheres que se submetem a uma cirurgia plástica. Para ele, percebe-se que a sociedade em geral revela uma tendência de culpar a própria mulher como se fosse um crime ou algo reprovável o fato da mesma procurar esse tipo de procedimento estético. “Essa cultura de culpar a mulher (vítima) pelo erro ou problema ocorrido nesse tipo de procedimento cirúrgico (plástica) tem que terminar no Brasil. Da mesma forma, todo profissional da área médica, em especial que presta serviço na área da cirurgia plástica deveria ser obrigado pelo Conselho Federal de Medicina a contratar um seguro para poder trabalhar e apresentar um modelo padrão de contrato de prestação de serviços com todas as informações específicas, necessárias e adequadas respeitando os artigos 8ºe 9º do CDC, frisou.
Nota-se, portanto, que a conduta do réu ofendeu os princípios do CDC estabelecidos nos artigos 8º e 9º e, por decorrência lógica, surge a obrigação de reparar o dano moral e estético suportado pela autora. “As cicatrizes decorrentes das cirurgias feitas pelo réu são horrorosas. As fotografias apresentadas no processo revelam isso. A autora, na condição de mulher, sofreu um abalo emocional e psicológico muito difícil de recuperar. Evidente que o dano suportado pela vítima (cicatrizes eternas) ofenderam sua dignidade humana e seu direito de personalidade”, enfatizou. (Texto: Arianne Lopes – Centro de Comunicação Social do TJGO)