O juiz Wilson Ferreira Ribeiro, da 2ª Vara de Família da comarca de Goiânia, concedeu à Telma Maria*, o reconhecimento da maternidade socioafetiva com retificação de seu registro civil, para incluir a companheira de sua mãe adotiva, Patrícia*, como sua segunda mãe, também já falecida. Na sentença, proferida neste mês de junho de 2021, o magistrado determinou que se proceda a averbação em seu assento de nascimento com a inclusão do nome da agora mãe e respectivos avós maternos, com a expedição do correspondente mandado ao cartório de registro civil competente.
O magistrado ponderou que a filiação socioafetiva, sob o aspecto sociológico, direciona-se para a efetiva convivência, com características de afeto, respeito e demais direitos e deveres na ordem familiar. “Para essa nova definição de paternidade/maternidade, pai ou mãe não é apenas a pessoa que gera e que detém vínculo genético com a criança. Ser pai ou mãe, antes de tudo, é ser a pessoa que cria, instrui, ampara, dá amor, carinho, proteção, educação, dignidade, enfim, a pessoa que realmente exerça funções próprias de pai ou mãe em atendimento ao melhor interesse da criança”, ressaltou Wilson Ferreira Ribeiro.
Na Ação Declaratória de Reconhecimento de Maternidade Socioafetiva Post Mortem c/c Retificação de Registro Civil, a autora Telma Maria* sustentou que, ainda recém-nascida, foi adotada por Margarida*, que passou a conviver, a partir de 1987, em união estável homoafetiva com Patrícia*. Com o falecimento de Margarida*, em novembro de 2006, a sua companheira ajuizou Ação de Reconhecimento de União Estável Post Mortem, em face da filha adotiva, tendo sido julgado procedente.
Telma Maria afirma que a partir da morte de sua mãe adotiva, passou a ser criada, como filha, por Patrícia. Esclarece que cresceu em sua companhia, se casou, mas nunca perdeu o contato com a suposta mãe de criação, que veio a falecer em 2017. Com isso, pleiteou o reconhecimento da maternidade socioafetiva com a retificação de seu registro civil, a fim de incluir Patrícia como sendo sua segunda mãe.
Afeto não decorre de herança genética
Wilson Ferreira Ribeiros também realçou que o afeto não decorre da herança genética herdada dos pais biológicos. Os laços de afeto e solidariedade derivam da convivência e não dos precedentes genéticos ou sanguíneos. O magistrado mencionou que o vínculo socioafetivo decorre da convivência cotidiana, de uma construção diária, não se explicando por laços genéticos, mas pelo tratamento estabelecido entre pessoas que ocupam reciprocamente o papel de pai/mãe e filho/filha, respectivamente.
“Naturalmente, a filiação socioafetiva não decorre da prática de um único ato. Não teria sentido estabelecer um vínculo tão sólido através de um singular ato, devendo ser marcada por um conjunto de afeições e solidariedade que explicita, com clareza, a existência de uma relação entre pai/mãe e filho/filha”, expôs o juiz,registrando que não há óbice à coexistência da maternidade biológica, a adotiva e socioafetiva (multiparentalidade), em virtude da realização do princípio da dignidade humana, não havendo hierarquização dos vínculos.
Para ele, há que se reconhecer o relevante peso de Patrícia ter se valido da relação maternal afetiva de longos anos com a requerente, visando ter reconhecido a união estável com Margarida, pois agora, quem busca o reconhecimento de algo já mencionado e usado como prova, é justamente a filha Telma Maria.
Por último, o juiz Wilson Ferreira Ribeiro declarou que não foi possível saber ao certo se o de cujus efetivamente tinha o desejo expresso de adotar ou de ter a maternidade reconhecida judicialmente. Entretanto, ficou claro que a relação que ela possuía com a autora foi como se sua mãe fosse, pois assim expôs em suas razões quando buscou o reconhecimento da união estável com a genitora da requerente em meados de 2007. * os nomes mencionados são fictícios (Texto: Lílian de França – Centro de Comunicação Social do TJGO)