À unanimidade de votos, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) reformou sentença da primeira instância e negou pedido de Jordana Cássia Peixoto Ribeiro e Rezende, que trabalhou voluntariamente por mais de dois anos no Departamento Estadual de Trânsito de Goiás local (Detran) e requereu indenização equivalente aos 26 meses não recebidos, além de férias e 13° salários.
Consta dos autos que, após aprovação em processo seletivo, Jordana prestou serviços ao Detran, particularmente ao Ciretran (Circunscrição Regional de Trânsito) de Goianésia, de 2 de janeiro de 2007 a 28 de fevereiro de 2009, ocupando cargo em comissão. Durante esse tempo ela nunca entrou na folha de pagamento mas continuou trabalhando normalmente, diante da promessa de receber remuneração no valor de R$ 1.362,00 por mês.
Segundo a relatora, desembargadora Elizabeth Maria da Silva, não é aceitável que alguém preste serviços durante mais de dois anos sem receber contraprestação alguma. Para ela, apenas por meio do chamado provimento alguém é investido no exercício do cargo, emprego ou função pública. “Esse ato administrativo, posse, nada mais é que a aceitação, pelo servidor, das atribuições do cargo, momento em que assume o compromisso de bem servir”, destacou.
Ainda de acordo com Elizabeth, não há provas nos autos de que a administração pública estadual tivesse a intenção de admitir Jordana em seus quadros de servidora comissionada. Além disso, segundo ela, Jordana tinha pleno conhecimento de que não havia relação jurídica oficial entre ela e a administração estadual, nem mesmo autorização que lhe permitisse iniciar suposta prestação de serviços ao Ciretran de Goianésia.
A relatora lembrou também que o trabalho voluntário está disciplinado pela Lei Federal n° 9.608, de 18 de fevereiro de 1998, que, em seu artigo 1°, assevera que o trabalho prestado de forma voluntária não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim.
A ementa recebeu a seguinte redação: Apelação Cível em Ação de Cobrança. Suposta Prestação de Serviços Por Mais De Dois Anos Sem Remuneração. Afronta aos Princípios da Razoabilidade e da Legalidade. Necessidade de Ato Oficial de Posse em Cargo Comissionado para Ensejar Direitos Laborais. Inexistência. Violação ao Princípio da Boa Fé. Trabalho Voluntário. Ausência de Repercussões Trabalhistas e Previdenciárias. Pretensão Julgada Improcedente. Sentença Reformada.1. Não encontra suporte no princípio da razoabilidade,que alguém preste serviços mais de dois anos ao Detran/Go sem receber contraprestação alguma.Raciocínio contrário, resultaria na inevitável conclusão de que a parte já sabia, de antemão, que seu labor era voluntário e, assim, se manteria até que eventualmente surgisse uma oportunidade oficial de assumir futuro cargo em comissão ou ajustamento de contrato temporário de trabalho, nos termos da Lei estadual nº 13.664, de 27 de julho de 2000. 2. O ato de nomeação para o exercício de cargo de direção ou função comissionada é que efetivamente produz efeitos jurídicos na remuneração e no patrimônio jurídico do servidor quanto ao exercício da função comissionada, e não eventual labor voluntário despido do mínimo de oficialidade. 3. Considerando que a apelada, ciente de que não mantinha vínculo oficial algum com a Administração Pública, porquanto não foi nomeada para ocupar cargo em comissão ou temporário, mas, ao arrepio da boa fé, continuou engendrada de forma irregular na máquina estatal, como um espectro de servidor público, não há que se falar em indenização alusiva às verbas remuneratórias postuladas na petição inicial. 4. Tendo em vista que o serviço voluntário não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim, por expressa determinação legal neste sentido, o trabalho desempenhado não pode ser computado com o objetivo de receber vencimentos, férias e, tampouco, gratificações natalinas, como foi postulado na petição inaugural. Inteligência da Lei federal nº 9.608, de 18.02.1998. 5. É impossível a pretensão de reconhecimento de vínculo de fato com o Estado, em virtude da sujeição do ente público ao princípio da legalidade e às restrições constitucionais, daí porque a pessoa física que presta serviço à Administração Pública por vontade própria, não faz jus a qualquer contraprestação, consistindo a sua eventual remuneração em ato desprovido de embasamento legal. 6. Apelação Conhecida e Provida. Sentença Reformada In Totum. (201092025375)” (Texto: Arianne Lopes – Centro de Comunicação Social do TJGO)