Em visita ao povoado de Arantina, (pertencente à comarca de Acreúna) na manhã desta quinta-feira (3), o corregedor-geral da Justiça de Goiás, desembargador Walter Carlos Lemes, foi conhecer de perto a situação vivenciada por quase 3 mil famílias que há quase 60 anos ocupam áreas e imóveis em situação irregular e não têm as devidas escrituras. Com a finalidade de buscar alternativas viáveis, ouvir os representantes locais para a solução efetiva do problema e garantir, assim, o direito de moradia aos moradores desse povoado, um dos mais básicos de qualquer pessoa, a Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás (CGJGO) promoveu a segunda audiência pública em Acreúna.
Emocionada, a aposentada Maria Alves Freitas, de 85 anos, que mora em Arantina desde a década de 60, foi uma das residentes locais que recebeu a visita e o carinho do corregedor-geral e de toda a equipe da Corregedoria e representantes do Poder Judiciário. Ela contou as dificuldades sofridas ao longo dos anos com a falta de regularização do imóvel e declarou que não se sente completamente feliz. “Parece bobagem, mas falta uma parte da gente. Moro aqui há tanto tempo e ninguém nos valoriza, nem nos dá atenção porque não temos essa escritura. O documento que tenho da minha casa é um recibo velho e amarelado pelo tempo. Meu sonho é olhar para o papel que oficializa meu patrimônio no meu nome para que eu possa deixá-los de garantia para os meus filhos e netos”, comove-se.
Acompanhado dos juízes Murilo Vieira de Faria, que está à frente dos assuntos afetos à regularização fundiária pela Corregedoria, Reinaldo de Oliveira Dutra, da Vara Judicial de Acreúna e que levou ao conhecimento da Corregedoria a angústia dos moradores de Arantina, Vivian Martins Melo Dutra, diretora do Foro local, e Rodrigo de Melo Brustolin, da 3ª Vara Cível de Rio Verde, que se deslocou da comarca pela segunda vez para participar do evento, o corregedor-geral falou da importância em tentar a solução amigável da demanda usando ferramentas conciliatórias e colocou a CGJGO à disposição da população dos promotores, advogados, representantes do Poder Público e população em geral para sanar o caso. “O direito é a arte de dar a cada um o que é seu, sem lesar ninguém. A resolução amigável dos conflitos, inclusive utilizada hoje de forma pioneira pela Corregedoria também no âmbito administrativo, é a melhor saída para dar fim ao sofrimento dessas pessoas, privadas por anos de direitos essenciais ao ser humano. Fiz questão de ver a realidade desses cidadãos conhecendo o povoado e conversando com os habitantes locais. Envidaremos todos os esforços para facilitar a regularização dessas áreas e resgatar a dignidade de cada residente daqui”, prontificou-se.
Desburocratização e inovação
Por sua vez, Murilo Faria lembrou que a intenção da Corregedoria nesta gestão é desburocratizar os procedimentos resolvendo as situações sociais, principalmente no que tange à regularização fundiária, e ressaltou que o papel do Poder Judiciário no contexto atual é justamente promover o acesso dos cidadãos a uma Justiça mais humanizada e aberta ao diálogo.
A inovação da Corregedoria na criação da Comissão de Unidade de Mediação e Acordo, Gerenciamento de Crises e Prevenção de Demandas, denominada UMA, com o objetivo de difundir uma cultura de paz na solução amigável dos conflitos utilizando a conciliação no âmbito administrativo-correcional, foi citada pelo magistrado, que acentuou a iniciativa como pioneira no País. “O juiz hoje precisa sair do seu gabinete e se conscientizar de que tem uma missão social importante. No caso de Arantina, essa situação fere inclusive a dignidade humana e estamos conscientes de que a conciliação pode ser a medida mais eficaz para dar a esses moradores a oportunidade de ter essas escrituras em mãos e poder fazer planos para o futuro vendendo seu patrimônio com segurança jurídica. Com a implementação da Uma, Goiás sai na frente mais uma vez e vamos intervir nessa situação imbuídos do espírito conciliatório”, reforçou.
Sensibilizado com a situação dos moradores de Arantina, com a qual se deparou desde 2013, o juiz local Reinaldo de Oliveira Dutra pontuou que a audiência pública é de suma importância para a população local, pois além de aproximar o Judiciário da sociedade, proporciona a troca de conhecimento, expressão de ideias, sugestões e solução de dúvidas diversas relacionadas ao problema de Arantina. “O apoio da Corregedoria está sendo imprescindível para que possamos alcançar juntos esse objetivo e realizar o sonho dessas quase 3 mil famílias que hoje vivem em condições precárias e irregulares. Essa união faz a força e a CGJGO nos orientará acerca das medidas cabíveis a serem tomadas e na correção dos rumos almejados. Sem dúvida, encontraremos a forma mais adequada e rápida de regularizar esse problema. Com os documentos em mãos, os moradores terão seus imóveis valorizados e acesso a crédito, que hoje é negado a eles justamente pela falta das escrituras das áreas. A situação fática, em si, gera insegurança jurídica, uma vez que a população fica sem acesso a financiamentos, não pode comercializar suas propriedades e fica à margem de um simples recibo”, enfatizou.
União e imparcialidade
A promotora de Justiça local Anna Edesa Ballatore Lins Boabad contou que embora tenha tomado conhecimento da situação há pouco tempo quando foi procurada pelo presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Acreúna, Rafael Augusto Justino Pereira, e pelo juiz Reinaldo Dutra, o Ministério Público não irá se eximir da parte que lhe compete, uma vez que existe o interesse público, da coletividade, envolvido. “Vamos auxiliar no estudo das leis e analisar tudo de forma imparcial, sem conceder privilégios a ninguém. Contudo, lutaremos para resolver o mais rápido possível a legalização desses imóveis e já estivemos reunidos também o presidente da Agehab. Tenho certeza que com a ajuda da Corregedoria tudo será facilitado”, acentuou. Ao fortalecer o posicionamento da colega, o promotor Sandro Henrique Silva Halfeld Barros, também de Acreúna, disse que o MP não ficará parado, nem acomodado. “Esse é um passo importante nessa caminhada, mesmo que demande tempo e perseverança não desistiremos”, afirmou.
Já o presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) local, Rafael Justino, parabenizou a equipe da Corregedoria e o juiz Reinaldo Dutra e enalteceu o senso de Justiça e humanidade que tem prevalecido para dar solução a causa de Arantina. “Da nossa parte, dispensaremos apoio irrestrito. Aglutinamos vários colegas e deixo aqui o registro do meu esforço pessoal e classista para o êxito dessa questão. A OAB também tem uma preocupação social e somos protetores do contraditório e da ampla defesa”, realçou. Em seu discurso, o prefeito municipal Edmar Neto lembrou que a demanda é conhecida por toda a sociedade e também pelo Poder Público local. “Disponibilizaremos o que for necessário para resolver esse problema que se arrasta por tantos anos. A maioria das áreas não é documentada e talvez seja o caso de realizar uma força-tarefa em um espaço breve de tempo”, acentuou.
A conquista desse direito é um sonho antigo de todos, segundo o vereador Júlio César Naves Filho, presidente da Câmara Municipal, conhecido como Julinho da Arantina, que mora no local desde criança. “A minha emoção é genuína ao perceber que existe uma união de esforços para que esse povo seja finalmente reconhecido em seus direitos. Infelizmente, ninguém que mora em Arantina consegue hoje fazer um financiamento, nem recebe um cheque moradia. Nós, políticos, perante essa população, estamos desacreditados e, sem dúvida, o Judiciário nos dá uma credibilidade maior na resolução desse problema”, enalteceu. Também compuseram a mesa da audiência pública, o presidente da Câmara Municipal, o vereador Júlio César Naves de Melo e o tabelião do Cartório do Registro de Imóveis de Acreúna, João Elias Martins. (Texto: Myrelle Motta - assessora de imprensa da Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás/Fotos: Wagner Soares - Centro de Comunicação Social do TJGO) Veja matéria anterior da primeira audiência pública