Todos os portadores de xeroderma pigmentoso (xp), que participaram do esforço concentrado realizado no dia 20 de agosto pela equipe do Programa Acelerar - Núcleo Previdenciário do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), em Araras, já estão com os benefícios implantados pela Agência de Atendimento de Demandas Judiciais da Gerência Executiva do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em Anápolis. O povoado Recanto das Araras, localizado no município de Faina, a 240 quilômetros de Goiânia, é o local que tem a maior incidência da enfermidade no mundo.

 

A informação foi prestada pelo procurador federal do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Joaquim Pedro da Silva, ao ressaltar que a implementação dos benefícios previdenciários ocorreu quase simultaneamente às audiências efetuadas em Araras, cuja iniciativa foi da Procuradoria Federal em Goiás, por meio do chefe do órgão, Bruno Cézar da Luz Pontes, com o apoio da Gerência do INSS de Anápolis. Ele esclareceu ainda que foi cedido especialmente para auxiliar nos trabalhos o servidor do INSS, Edimar Carlos Paiva. No decorrer do mutirão previdenciário, foram realizadas 31 audiências, concedidos 27 benefícios, e proferidas 100% das sentenças. Além dos auxílios legalmente garantidos (aposentadoria rural, por invalidez e Loas), a população de Araras foi agraciada com doações feitas por vários magistrados, entre juízes e desembargadores, cujo valor já alcança aproximadamente R$ 12 mil.

Em razão do trabalho humanizado promovido em Araras pelo grupo integrante do Acelerar Previdenciário composto por juízes, promotor, peritos judiciais, procurador federal, equipe do INSS, assistentes sociais e pedagoga, além da ampla repercussão dada pelos veículos de comunicação de âmbito local e nacional (Jornal Nacional, Correio Braziliense, Rádio Justiça, Bom Dia Goiás, Jornais O Popular e Diário da Manhã), o problema se tornou conhecido em todo o País e tem mobilizado o Poder Público e a sociedade em geral.

O êxito dessa iniciativa motivou a presidente da Associação Brasileira de Xeroderma Pigmentoso, Gleice Machado, a encaminhar um ofício ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), no qual solicita a adoção das providências legais e administrativas pertinentes para que seja expedida uma recomendação expressa a Justiça Federal e a todos os Tribunais de Justiça do País em prol da realização de mutirões previdenciários voltados ao atendimento de todos os brasileiros portadores de xeroderma pigmentoso, a exemplo da bem-sucedida edição promovida pelo Acelerar Previdenciário em Araras.

“Por meio de um esforço concentrado muitos portadores de xp que não tinham os seus direitos reconhecidos, tiveram sua cidadania resgatada mediante a concessão, na forma legal, de benefícios previdenciários, os quais são extremamente importantes para a sobrevivência e tratamento desses pacientes”, frisou, ao reiterar no documento que a normativa deve atender todos os que sofrem da doença no Brasil, sem nenhuma exceção, de forma célere, direta, concentrada e transparente, como ocorreu com a comunidade de Araras.

Pelos resultados positivos obtidos com o mutirão e pela dedicação dispensada para a assegurar a realização do programa no povoado de Araras, o deputado Antônio Carlos Caetano de Moraes encaminhou ao presidente da Assembleia Legislativa de Goiás, Hélio Sousa, requerimento com a finalidade de que seja endereçada uma moção de aplauso a juíza Alessandra Gontijo Amaral, diretora do Foro da Cidade de Goiás. Além disso, requisita que seja incluso no orçamento de 2016 do Estado, recursos necessários à pavimentação asfáltica da GO-456 (trecho Araras-Faina) para garantir acesso mais fácil ao povoado e assegurar esse direito aos portadores de xeroderma pigmentoso. Devido à importância da matéria, o parlamentar solicita que o documento seja apreciado rapidamente e tenha preferência.

Sobre o xeroderma pigmentoso

O xeroderma pigmentoso é uma doença genética, rara, mortal e sem cura, que deixa a pessoa hipersensível à exposição solar e causa lesões e tumores cancerígenas até mesmo por um simples contato com qualquer espécie de luz, inclusive com as lâmpadas comuns residenciais. As consequências são as constantes mutilações e, consequentemente, a morte. Por ser uma doença recessiva, o xeroderma é comum entre nascidos de casamentos consanguíneos - em que o risco de duas pessoas terem o mesmo erro genético é maior. A doença afeta ambos os sexos e além do risco de câncer de pele ser aumentando em mil vezes, a incidência de cânceres internos, em 15 vezes.

As lesões cutâneas estão presentes nos primeiros anos de vida, evoluindo de forma lenta e progressiva, e são diretamente relacionadas à exposição solar. Aos 18 meses, metade dos indivíduos afetados apresenta algum sinal algumas lesões nas áreas expostas ao sol; aos 4 anos cerca de 75%, e aos 15, 95%.

Os indivíduos podem exibir ainda anormalidades neurológicas progressivas (observadas em cerca de 20% dos casos) e alterações nos olhos. Aproximadamente 80% deles apresentam alterações oftalmológicas que incluem fotofobia, conjuntivite, opacidade da córnea e desenvolvimento de tumores oculares. Cerca de 20% dos pacientes têm alterações neurológicas como microcefalia, ataxia (perda de coordenação dos movimentos musculares voluntários), surdez neurossensorial e retardo mental. Há também aumento do risco de outros tumores cerebrais, gástricos, pulmonares e leucemia.

Maior número de doentes do mundo

Pesquisa recente efetuada pela Universidade de São Paulo (USP) detectou na comunidade, após uma segunda coleta de sangue realizada recentemente, outros 169 portadores de XP. Anteriormente, numa primeira avaliação, em meados de 2010, foram comprovados 21 doentes, dos quais 2 parentes residiam nos Estados Unidos. Nas últimas cinco décadas, uma centena de pessoas naturais do vilarejo morreram corroídas pelo câncer. Mais de 60 perderam a vida com os mesmos sintomas, mas não receberam diagnóstico médico.

Por não haver registro de tamanha incidência dessa enfermidade em nenhuma outra parte do mundo, os doentes de Araras são objeto de estudo do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP), maior do País nesse segmento. Integra a equipe o maior conhecedor de xeroderma pigmentoso no Brasil, o biólogo Carlos Frederico Martins Menck, que estuda a doença desde 1976 e esteve no povoado para conversar e examinar pessoalmente os pacientes.

Cerca de 200 famílias residem em Araras. A maioria é formada por casamento entre parentes, principalmente primos. Foi justamente essa cultura que culminou na perpetuação e proliferação da doença na comunidade, já que é comum entre nascidos da união entre pessoas da mesma família. A estimativa de casos no mundo é de um em cada grupo de 200 mil pessoas, contudo, em Araras, mais de 20 histórias foram registradas em 2010 num só povoado, a maior média do mundo. (Texto: Myrelle Motta – Centro de Comunicação Social do TJGO)

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