Os condomínios fechados não têm o condão de exigir carteira nacional de habilitação dos motoristas visitantes que adentram nas propriedades. O entendimento é do desembargador Itamar de Lima (foto), que, em decisão monocrática, ponderou que cabe apenas aos agentes de trânsito tal prerrogativa, e não a funcionários de segurança privada.
“Observo que os funcionários de portarias de condomínios fechados não dispõem de competência para fiscalizar o trânsito, tampouco intervir no direito de ir e vir da população e de se utilizarem do Código de Trânsito Brasileiro para fiscalizar o tráfego interno dos moradores e convidados, fato este que, por si só, demonstra afronta ao Estado Democrático de Direito”, conforme pontuou o magistrado.
O entendimento é resultado de um processo de funcionários do Condomínio Aldeia do Vale, em Goiânia, contra um proprietário de uma das casas do local. As partes se desentenderam quando um amigo do morador teve a entrada barrada por apresentação de CNH vencida. O réu foi, então, chamado à portaria para acompanhar o visitante, quando começou a discussão – motivo pelo qual os trabalhadores impetraram pedido de danos morais.
O pleito dos funcionários foi deferido em primeiro grau, na 3ª Vara Cível de Goiânia, mas o desembargador o reformou integralmente, por entender que a postura do condomínio foi equivocada, já que houve “usurpação da função pública praticada por esses funcionários de empresas de segurança privada”, uma vez que, apenas por meio de agentes de trânsito, devidamente aprovados em concurso público, “é possível o exercício de fiscalização de irregularidades praticadas por motoristas, sejam relativas à validade da CNH, sejam para aplicação de multas”.
O poderio instituído pelos condomínios horizontais de alto padrão foi também questionado pelo desembargador Itamar de Lima. “Como cidadão atento, percebo que em tais castas de concreto, aproveitando-se de certa omissão do poder público, foi sendo forjado um poderio a que sem pudores poderíamos chamar de obsceno e indecoroso, com criação de normatividades que nem nossa ingênua imaginação possa imaginar”.
Sobre a questão, o magistrado também discorreu que “o princípio da dignidade da pessoa é o fundamento maior do Estado Democrático de Direito e a justificativa de antemão plausível acerca da necessidade social de acastelamento jamais terá o condão de subjugar o império da lei, o respeito ao homem e, por fim, ter a pretensão de fazer emudecer o Poder Judiciário, mormente quando se está diante de um fato abominável”.
Suposto desrespeito
A respeito do pedido indenizatório dos funcionários acerca do suposto desrespeito cometido pelo morador durante o conflito, o desembargador pontuou que os autores não apresentaram provas lícitas, tampouco testemunhas. Eles juntaram aos autos uma gravação de uma briga, feita sem o aval do proprietário, sobre outro problema, desta vez, envolvendo um cachorro do homem – circunstância que não foi o objeto da demanda processual. Veja decisão. (Texto: Lilian Cury – Centro de Comunicação Social do TJGO)