Esse encontro é um marco histórico para a atuação do pedagogo no campo jurídico em todo o País e o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás acreditou em cada um de nós ao nos proporcionar essa oportunidade ímpar que certamente dará aos profissionais maior visibilidade nacional e reconhecimento da profissão aos olhos do próprio Poder Judiciário. A análise foi feita pela pedagoga do Tribunal do Justiça do Pará (TJPA), Riane Freitas, também doutora em Educação, que atua há 12 anos na seara jurídica, durante o encerramento do 1º Encontro de Pedagogia Jurídica do País realizado desde ontem (25), no Auditório da Associação dos Magistrados de Goiás (Asmego).
O evento é uma realização do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, da Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás (CGJGO), por meio da Secretaria Interprofissional Forense, e da Escola Judicial do Tribunal de Justiça de Goiás (Ejug). Para a construção de diretrizes e instrumentais no que tange a atuação do pedagogo jurídico foram formados hoje nove grupos de trabalho que englobaram as seguintes áreas: medidas socioeducativas, família, depoimento especial e violência contra crianças e adolescentes, adoção, acolhimento, violência doméstica, execução de penas alternativas, escolas judiciais e núcleos de apoio às equipes interprofissionais.
Ao fazer uma explanação sobre a realidade do pedagogo no TJPA, Riane Freitas explicou que logo após a implantação das três varas especializadas em violência doméstica a equipe multidisciplinar do TJPA foi solicitada já com a atuação dos pedagogos. “Temos hoje o mesmo respeito dos psicólogos e dos assistentes sociais, inicialmente era diferente porque ninguém conhecia o nosso trabalho, principalmente os magistrados. Quando viemos para o TJPA foi difícil porque estávamos acostumados com o contexto escolar, mas fomos construindo nosso espaço e mostrando a importância do nosso trabalho, do olhar pedagógico nessas áreas. O TJPA e o TJPE são atualmente os dois tribunais com maior número de pedagogos do País. Somente o TJPA tem 36 pedagogos, mas ainda fica atrás do número de psicólogos e assistentes sociais que é bem superior. Por essa razão, encontros dessa natureza são de suma importância para a valorização da nossa profissão. O TJGO enxergou mais longe e deu um passo à frente nesse sentido”, elogiou.
Um realidade bem diferente é experimentada pela pedagoga Bruna Borges Leite Alencar que faz parte da equipe multidisciplinar do Grupo de Gerenciamento de Equipes Multidisciplinares (GGEM) do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (TJTO). A falta de capacitação na área de atuação tem sido um fator difícil para o exercício da função, já que, ao contrário da maioria dos tribunais, a vaga para pedagogo no TJTO não é provida por meio de concurso, mas de um credenciamento com critérios específicos. Por isso, ela classifica como de suma importância a iniciativa do TJGO para que sejam adotadas as diretrizes norteadoras do profissional que trabalha na esfera jurídica. “Na verdade esse evento é uma porta aberta, um momento a aprimoramento, agregação de conhecimentos, pois ainda temos dúvidas e estamos caminhando para solidificar nossa identidade profissional”, realçou.
Vertente complexa
Como lida com casos melindrosos, cujas demandas são, em sua maioria, relacionadas a situações de abuso sexual contra crianças, Bruna conta que é preciso saber como proceder nessas situações, pois o trabalho do psicólogo e do assistente social são muito diferentes do pedagogo, que deve avaliar o contexto do ponto de vista pedagógico. “Precisamos estar atentos às adversidades e ter uma visão ampla do problema. Já cheguei a ir em uma casa que não tinha portas e não consegui ter privacidade para falar com nenhum dos familiares. Era uma situação de abuso sexual contra duas crianças e o agressor morava na residência. Então, com a ajuda dos orientadores e professores da escola rural levei todos para serem ouvidos nesse ambiente e deu certo”, comentou.
Uma grande preocupação da pedagoga do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE), Mirelly Shyrleide Praseres da Silva, que passou no concurso há 2 anos e 5 meses, é a ausência de um Conselho específico que regulamente o trabalho dos profissionais. “Ao longo dos anos a educação sofreu mudanças em seu conceito, pois deixa de ser restrita ao processo ensino aprendizagem em espaços formais, ultrapassando os muros da escola para diversos segmentos. Me preocupo com a falta do Conselho que regulamente nossa profissão, pois isso acaba gerando insegurança em algumas ocasiões, e o amparo legal acerca da nossa atuação é necessário. Os assistentes sociais e psicólogos, por exemplo, tem prática profissional respaldadas pelos respectivos conselhos que além de regulamentar, orientam e auxiliam sua profissão. Acredito que nosso maior desafio é fortalecer a atuação do pedagogo no campo jurídico, além de superar as dificuldades que inviabilizam a efetividade do nosso trabalho porque ainda existem muitos campos de atuação a serem conquistados por nós”, ressaltou.
Mirelly Shyrleide que atua em áreas diversificadas junto a 2ª Vara Cível de Limoeiro, que tem competência cumulativa com a Infância e Juventude, observa que a boa aceitação dos magistrados locais hoje se deve justamente ao diferencial do trabalho realizado pelo pedagogo. “Lido com muitas demandas referentes a curatela, guarda, regulamentação e visitas, adoção, abuso sexual e violência doméstica e percebo com clareza como os juízes levam em consideração nosso relatórios e pareceres para embasarem sua decisões, que são feitos individualmente. Sem dúvida, esse é um grande passo na valorização da nossa profissão”, destacou.
Anseio profissional
Sobre o encontro, ela enfatiza que houve um grande anseio dos pedagogos para que ele fosse realizado. “O TJPE atuou como um parceiro do TJGO nesse evento e existe a necessidade eminente de formalizar as práticas desempenhadas pelos pedagogos, sobretudo no campo jurídico. Um caminho só pode ser trilhado realmente caminhando, pois somos protagonistas dessa pedagogia nascente”, acentuou. Única pedagoga a fazer parte do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, Amelici Carla Rego, conta que atua na 1ª Vara da Infância e Juventude de São Luís do Maranhão, juntamente com duas assistentes sociais e duas psicólogas. Como só trabalha com processos de âmbito cível, especificamente com medidas protetivas de crianças institucionalizadas e é gestora do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA), ela considera o momento do encontro único. “O pedagogo ainda é um profissional muito novo no Poder Judiciário e a ideia do TJGO com a Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás e a Escola Judicial de promover esse encontro é fantástica, nos sentimos acolhidos e abraçados”, engrandeceu.
Participante ativa do evento, a pedagoga da Secretaria Municipal de Educação e servidora da CGJGO, Gerzilei Rabelo de Almeida Costa, lembrou que há alguns anos o Judiciário era muito fechado no que se referia ao aspecto da educação, situação completamente inversa atualmente com reconhecimento por parte dos próprios magistrados. “Nos deparamos com um novo desafio para as práticas do pedagogo em um espaço extra escolar, pois as demandas são muito diversas. Esse encontro vem nos proporcionar uma rica troca de experiências, principalmente na nossa prática de atendimento às crianças e aos adolescentes na realização de visitas domiciliares e escolares. É realmente um momento crucial, de importância histórica para todos os pedagogos brasileiros que podem demonstrar suas realidades sob outros ângulos”, pontuou.
Sobre o evento
O encontro contou com a presença de pedagogos de vários Estados do País como Tocantins, Maranhão, Acre, Pará Amazonas, Rio Grande do Norte, Paraná, Roraima, Bahia, Rondônia e Distrito Federal. A abordagem principal foi voltada para o papel desempenhado pelo recém-chegado pedagogo ao ambiente jurídico, que hoje atua nas equipes interprofissionais forenses dos Tribunais de todo o País, bem como os desafios enfrentados por estes especialistas diante da realidade deste novo campo de conhecimento. Com carga horária de 16 horas, o encontro teve a programação dividida em dois momentos: no dia 25 (primeiro dia) foi aberto à comunidade acadêmica e no dia 26 (segundo dia) restrito aos profissionais dos Tribunais. Constaram do cronograma palestras, mesa redonda, debate com especialistas nesse campo de trabalho, além da formação de grupos de trabalho (por área de atuação) nesta último dia. (Texto e fotos: Myrelle Motta - assessora de imprensa da Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás)