A linguagem e capacidade de reter acontecimentos na mente se transformam ao longo da vida. Crianças e adolescentes têm formas únicas de comunicar e precisam de cuidado, em especial, quando o assunto envolve eventos traumáticos. Quando eles são vítimas ou testemunhas de crimes, o Poder Judiciário conta com as salas de depoimento especial, nas quais técnicos em entrevistas forenses trabalham em parcerias com magistradas e magistrados. Em Goiás, 14 comarcas detém unidades do tipo, que contribuem, diuturnamente, na elucidação, principalmente, de casos de abuso e violência sexual infantil. Hoje, 18 de maio, é o dia Nacional de Combate a essas violações.

“Todos somos capazes de reter memória, mas a capacidade mnemônica varia conforme a idade e o desenvolvimento. Uma violência infantil, muitas vezes, é interpretada como uma brincadeira, o que torna esse ato muito mais perverso. O importante, para nós, como operadores da Justiça, é tentar acessar esses conteúdos”, explica a juíza Maria Antônia de Faria.

Diariamente, a magistrada utiliza uma das salas de depoimento especial, localizada no Fórum Fenelon Teodoro Reis, em Goiânia, como titular da 1ª Vara Criminal dos Crimes contra vítimas hipervulneráveis, que abrange crianças, adolescentes, pessoas com deficiência e idosos. Ela explica que a prática “não é uma perícia, mas sim uma forma humanizada de escutar, sem revitimizar, a fim de entender o que vítima ou testemunha vivenciou ou presenciou, podendo ser realizada durante instrução processual ou para produção de provas”.

Diferente do formalismo das oitivas comuns, o público infanto-juvenil é atendido de uma forma mais lúdica, com linguagem adequada a cada faixa etária. Essa adaptação fica a cargo de um entrevistador ou entrevistadora preparada com o protocolo Brasileiro de Entrevista Forense. Desde o início da implantação em Goiás, há mais de sete anos, a psicóloga Patrícia Fiorin é uma das servidoras que atua na área. “O papel do entrevistador forense é atuar como um facilitador para a criança ou adolescente, respeitando sua fala, seus silêncios, dificuldades e fase de desenvolvimento, contribuindo, dessa forma, para que esse sujeito consiga dar seu relato sobre os fatos de uma forma mais protegida e acolhedora”.

Em uma sala separada, acompanham a entrevista integrantes da magistratura, ministério público e advocacia. A técnica ou técnico também utiliza um ponto eletrônico no ouvido, no qual a magistrada ou magistrado pode pedir determinadas perguntas ou, ainda, repassar dúvidas dos demais. “Uma criança de seis anos tem uma linguagem específica, enquanto uma de oito anos tem outra linguagem, diferente também da de um adolescente. Dessa forma, é feita a ‘tradução’ para essa comunicação adequada”, elucida Maria Antônia.

A magistrada faz questão de frisar que a pessoa acusada ou investigada nunca escuta ou acompanha o depoimento da criança ou do adolescente, que, inclusive, resguardado seu direito de não querer falar. A entrevista termina quando não há mais dúvidas ou quando a vítima ou testemunha entrevistada apresenta cansaço. “Geralmente dura cerca de 1h30, mas há casos da entrevista ter durado a tarde inteira. É bem diferente de uma oitiva criminal comum, no qual uma pessoa adulta é ouvida sobre um roubo, por exemplo, que dura de 5 a 15 minutos”, compara a juíza, para fins de explicação. (Texto: Lilian Cury / Fotos: Wagner Soares - Centro de Comunicação Social do TJGO)

  •    

    Ouvir notícia:

Programa de Linguagem Simples do TJGO