O adolescente Tiago Alexandre conheceu sua nova família aos 12 anos. Ele saiu de Luziânia (GO) e foi até Valentim Gentil (SP) para morar com seus pais, a professora e comerciante Vânia Gimenez e o padeiro Ricardo Gimenez. Tiago teve uma adoção tardia, termo utilizado para indicar a adoção de crianças que já possuem um desenvolvimento parcial em relação a sua autonomia e interação com o mundo. Não há uma idade mínima formal, em geral refere-se a crianças maiores de três anos.

De acordo com dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do total das adoções feitas no Brasil nos últimos seis anos, 47% foram de crianças que tinham de até 3 anos na data da sentença, 28% tinham de 4 a 7 anos completos, 17% tinham de 8 a 11 anos completos e 8% eram adolescentes, ou seja, maiores de 12 anos completos. A idade média na data da sentença de adoção encontrava-se na faixa de 5 anos.

Hoje, Tiago está com 14 anos de idade. Ele e seus pais conversaram com a equipe do projeto “Planejamento de Relações Públicas para o Juizado da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de Goiás: estratégias para auxiliar o processo comunicacional de Adoção Tardia”. Conheça um pouco mais sobre o processo com os personagens dessa história.

Como foi o primeiro contato com o Tiago?
Vânia: Como eu abri meu perfil para oito anos e meio em 2018, em maio de 2019 já ligaram de Campos do Jordão (SP) para conhecermos uma criança. Mas, por questão financeira, uma cidade turística, ir até lá quatro vezes era difícil. Não tínhamos condição de ir lá várias vezes. No mês de junho, eu entrei no grupo da cegonha, de busca ativa, foi onde eu conheci o abrigo Sagrada Face, onde estava o Tiago. Conversei com uma menina, da idade dele, eles estudavam na mesma escola. Ficamos um mês conversando e quando chegamos lá ela não quis sair da cidade. Hoje ela é adotada por uma família da cidade de Luziânia. E quando chegamos, quem veio na porta falar comigo? O Tiago. Ele olhou pra mim e falou: “Ela tá lá no quarto chorando, disse que não vai vir não.” E a expressão no olhinho dele foi como se dissesse assim: “Leva eu então, né! Eu tô aqui!” E foi assim, ele escolheu a gente. Eu fui lá fazer uma visita, conhecer uma criança que eu estava conversando e não era pra ser né, era pra ser o Thiago o nosso filho.

Durante esse tempo de convivência, de visita e de convívio com o Tiago, teve algum momento no qual vocês ficaram apreensivos, com medo de alguma coisa dar errado?
Vânia: Sim. O dia que ele fugiu de casa, pois não queria fazer a tarefa da escola. Nos primeiros dias, ficávamos falando: “Vamos Tiago, vamos fazer o dever de casa.” De repente, a casa ficou um silêncio e pensei: o Tiago fugiu. Eu corri atrás dele e disse: “Não vou desistir de você, vamos embora, vamos continuar.” Chegamos em casa e ele falou: “Não, a senhora é brava igual ao pai!” Daí a gente sentou e conversou. Quando foi no começo de setembro daquele ano (2019), ele já estava ficando há uns 20 dias em casa, foi quando eu tive a certeza que ele ficaria. Porque, naquele momento, eu podia falar que não queria, que daria trabalho, mas eu olhei para o outro lado e pensei que ele estava com medo, pois tudo era diferente: na escola, criar vínculo com a gente. Foi o momento que eu o acolhi, abracei e falei pra ele: “Não é porque você fugiu que eu vou desistir de você.” Naquele dia, ele pensou que apanharia, que eu puxaria a orelha dele. Eu o abracei e viemos embora, eu estava descalça, no meio da rua. E falei: “Meu Deus, eu não vou desistir de você.” Ele voltou pra casa comigo e nunca mais fez isso.

O que vocês mais gostam de fazer juntos?
Ricardo: O que a gente mais gosta de fazer é pedalar. No momento estamos com muito trabalho, mas a gente pedalava todos os dias. O que mais me aproximou, criou vínculo com o Tiago, foi o nosso pedal.

Vânia: O Tiago já andou mais de 80 quilômetros com o Ricardo. Ele fala assim: “A senhora não vai dar conta, é muito cansativo”.

Tiago, você já imagina o que quer fazer no futuro? Já conversou com seus pais?
Tiago: Quero ser um “paderão’’.

Ricardo: É porque sou padeiro e confeiteiro. Estamos construindo a padaria em casa.

E já aprendeu alguma receita?
Tiago: Só uma panquequinha, um bolinho.

Para quem está passando pelo mesmo processo, o que vocês aconselham em relação às expectativas e também ao perfil desejado?
Vânia: Eu gostaria de dizer para que as pessoas abram o coração. É difícil preencher essa lista, mas eu queria deixar a mensagem de que passamos por essa fase, vencemos e estamos na fila novamente. Um irmão ou irmã, colocamos um perfil para o Tiago ser o irmão mais velho. Ele pede um irmão e pensamos: por que não? A mensagem é abrir o coração, que Deus prepara o filho do propósito das nossas vidas. Quando se tem amor, tudo dá certo. O vínculo vai sendo criado aos poucos, não é do dia para noite, não dá para idealizar a criança perfeita, isso não existe. Vai ser o dia a dia, o desafio de educar, falar das nossas crenças, porque o Tiago chegou aqui e explicamos: “Olha Tiago, nós frequentamos uma igreja, lá temos uns amigos, é a nossa vida”. Ele aceitou isso de uma forma tranquila, fez novas amizades, então tudo depende dele também aceitar, não é só a gente. É uma troca, um desafio diário. Se eu tivesse pensado um pouquinho mais e não tivesse tanto medo, teria feito isso antes. Mas tudo acontece na hora certa, né! Essa é a mensagem: abrir o coração.

Ricardo: Eu vou deixar um recado que é: nunca desista dos seus sonhos. Por mais que a gente olhe e pense que não vamos conseguir, Deus sempre dá um escape e nos mostra um caminho certo. O medo vem, a circunstância vem, mas nunca desistimos do nosso sonho de ter um filho, sempre pedimos um milagre para Deus, mas o milagre de Deus não foi como nós queríamos, foi do jeito que Ele queria. Nos usar para sermos um milagre na vida de alguém. Então nunca desista, Deus sempre tem o melhor para nós e hoje Deus nos deu uma família abençoada.

Tiago: Essa família foi um presente de Deus, agora tenho outra família: dois pais, duas mães e três avós.

(Centro de Comunicação Social do TJGO)

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