“Sei exatamente o que significa não ter um pai tanto na vida quanto na certidão de nascimento. Não importa se o pai da minha neta está numa prisão, o que interessa é que ela tenha direito não só ao documento formal, mas a esse laço de afeto”. O depoimento comovido é da faxineira Ocilene da Silva Ferreira, de 28 anos, que, acompanhada da filha de 14 anos, levou a neta de seis meses para ser reconhecida pelo pai, preso há quase um ano. A ação, realizada na manhã desta quinta-feira (4) com 11 sentenciados para reconhecimento de paternidade, é do Programa Pai Presente, executado pela Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás (CGJGO). 

Sem conseguir se expressar com muitas palavras, o pai da pequena garotinha de apenas seis meses, com lágrimas nos olhos, fez o reconhecimento espontâneo da filha, de imediato, e, segurando sua pequena mãozinha pela primeira vez, sorriu quando alguns presentes comentaram que ela se parece com ele. “Ele jamais negou ser o pai da criança, mesmo antes de ser preso. Embora, ele e minha filha tenham ficado juntos uma única vez, o instinto paterno falou mais forte. Temos que ser justos sempre e um dia nossa menina vai crescer e vai nos questionar sobre o pai. Não podemos impedir que ela conheça e conviva com o pai. É um direito inegável dela e estou muito satisfeita da minha neta ter a oportunidade que não tive. Isso evitará muito sofrimento futuro para ela”, prevê Ocilene Ferreira.

Reconhecendo que a filha de quatro meses merece ter o nome do pai na certidão de nascimento, a estudante Angélica Silva Ribeiro, de 20 anos, elogiou o programa. “Eu e o pai da minha filha não nos relacionamos há algum tempo. Ele viu a menina recém-nascida e depois foi para a prisão. Hoje é um dia para ser comemorado porque minha menina terá seus direitos assegurados pela lei e o mais importante: a oportunidade de conviver com o pai graças ao Pai Presente”, enalteceu.

Para a coordenadora estadual do programa, juíza Sirlei Martins da Costa (foto abaixo à direita), auxiliar da CGJGO, a experiência de participar dessas audiências pela primeira vez estando à frente do Pai Presente é ímpar. “Esse é um projeto valioso e garante o direito mais básico de um ciadão: o de ter o nome do pai na certidão de nascimento. Se não permitirmos que um filho tenha total acesso ao pai, ainda que esteja preso, estaremos, de certa forma, condenando essa criança à mesma pena imposta ao seu genitor. Estaremos privando esses meninos e meninas de direitos legais importantes como o auxílio reclusão (que é possível se o pai, antes de ser preso, tiver trabalhado de carteira assinada com o devido recolhimento do INSS). Sem falar no essencial laço de afeto que deve ser construído entre pais e filhos para que a criança se torne um adulto saudável emocionalmente”, ponderou.

Emoção, coração e alma

O aspecto emocional, afeto ao coração e à alma de uma pessoa, sobretudo quando se trata de um vínculo indissolúvel como pai e filho, é o mais significativo nesses casos de reconhecimento de paternidade, conforme destaca o juiz Eduardo Perez Oliveira, coordenador do Pai Presente em Goiânia há cinco anos, desde o início do projeto em 2012. “Muita gente não tem conhecimento do programa por falta de informação. Não tem noção de como tudo é simples e direto, que até mesmo o teste de DNA é gratuito nas situações em que é solicitado via Pai Presente. O pai não é só aquele que está inserido em um papel frio, mas aquele que se dispõe a participar da vida do filho. Por isso, a importância desse programa, que estimula esses laços e remete ao verdadeiro exercício de cidadania. Os presos aqui tem o mesmo direito que qualquer pai e, no sentido emocional, os benefícios dessa iniciativa são imensuráveis”, pontuou.

Em 3 das 11 audiências concretizadas hoje, houve pedidos de DNA por parte dos pais sentenciados. Os outros oito reconheceram os filhos espontaneamente. Essa é a primeira audiência do ano e a 17ª promovida pelo Programa Pai Presente com presos desde a sua implantação. A iniciativa visa possibilitar, sem burocracia ou formalidades, o reconhecimento dos filhos, estabelecendo, assim, o vínculo de afetividade, uma vez que o contato físico entre pais e filhos menores dentro do complexo penitenciário é proibido. O Pai Presente já está instalado em 100% das comarcas goianas e foi regulamentado pelos Provimentos nº 12 e 16, de 6 de agosto de 2010 e 17 de fevereiro de 2012, da Corregedoria Nacional de Justiça.

Sem burocracia

Não é necessário comprovar renda para ter acesso ao programa, que é acessível a todas as classes sociais. A iniciativa busca aproveitar os Cartórios de Registro Civil do País, existentes em muitas localidades onde não há unidade da Justiça ou postos do Ministério Público (MP), para dar início ao reconhecimento tardio de paternidade. A partir da indicação do suposto pai, feita pela mãe ou pelo próprio filho maior de 18 anos, as informações são encaminhadas ao juiz responsável pelo Programa Pai Presente da comarca. O magistrado, então, tenta localizar e intimar o suposto pai para que ele se manifeste. Caso o reconhecimento ocorra de forma natural, com a presença da mãe (no caso de menores de 18 anos) e no cartório onde ocorreu o registro incompleto, a família poderá obter na hora uma autorização para a confecção de um novo registro de nascimento.

No Estado de Goiás, desde que foi implementado em abril de 2012, o Pai Presente já concretizou mais de 10 mil reconhecimentos paternos. Somente em Goiânia, são realizados de 400 a 500 procedimentos por ano. O reconhecimento pode ser feito por iniciativa da mãe, indicando o suposto pai, ou pelo próprio comparecimento dele de forma espontânea. Assim, é redigido um Termo de Reconhecimento Espontâneo de Paternidade que possibilitará a realização de um novo registro, constando a filiação completa.

Dessa forma, o Pai Presente se propõe não somente identificar o pai no registro de nascimento, mas reconhecê-lo como participante afetivo na vida do filho, contribuindo para o desenvolvimento psicológico e social dos filhos e fortalecendo os vínculos parentais. O programa funciona no térreo do Fórum Heitor Moraes Fleury (prédio central), na sala 180, no Setor Oeste. Os atendimentos são feitos continuamente de segunda a sexta-feira, das 8 às 18 horas. Os interessados podem entrar em contato também pelos telefones (62) 3216-4117 ou 9145-237 ou pelo e-mail Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.. (Texto: Myrelle Motta - assessora de imprensa da Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás/Fotos: Wagner Soares - Centro de Comunicação Social do TJGO)

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