Um dos maiores atos de amor incondicional que representa a abertura do coração e da mente para o acolhimento de um outro ser humano, abrigando-o no seio de uma família, é, sem dúvida, a adoção. Contudo, todo esse processo demanda preparação, serenidade e imensa capacidade de compreensão de todas as vertentes que envolvem esse contexto tão delicado e complexo. Atenta e sensível a este fator a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Goiás, por meio da Divisão Interprofissional Forense e da Comissão Judiciária Estadual de Adoção (Cejai), juntamente com a Coordenadoria da Infância e Juventude e a Escola Judicial de Goiás (Ejug), tem promovido, no formato on-line devido à pandemia da Covid-19, o Curso de Preparação Psicossocial e Jurídica para Pretendentes à Adoção que alcançou nos últimos seis meses quase 800 pessoas interessadas em adotar uma criança/adolescente, em apenas três edições.
Ao ressaltar a importância do curso, o juiz Gustavo Assis Garcia, auxiliar da CGJGO e que abriu a edição de outubro, acentuou que muitas crianças e adolescentes enxergam na adoção uma nova chance de vida no âmbito familiar e vislumbram, assim, a oportunidade que não tiveram para se desenvolverem de modo saudável e feliz. Justamente, por essa razão, como observou o magistrado, chamando à reflexão e responsabilidade os pretendentes, essa decisão é muita séria e representa uma mudança de vida que precisa remeter a muito comprometimento, dedicação e amor.
“Além de ser um ato de amor incondicional, os pretendentes assumem um compromisso legal em que respeito, carinho, amor e cuidado, assim como as condições materiais necessárias para uma vida digna da criança ou adolescente, são fundamentais”, frisou.
Ele mencionou ainda o Dia Nacional da Adoção, celebrado anualmente em 25 de maio, e que visa promover debates sobre um dos princípios mais importantes do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): o direito da convivência familiar e comunitária com dignidade. No entanto, a seu ver, essa reflexão não deve ficar restrita tão somente a esta data, mas deve ser diária. “Esse tema deve ser debatido e pensado todos os dias, pois afeta toda a sociedade e mexe com vidas humanas”, refletiu.
Discrepância
Explicando que a Constituição Federal garante aos filhos adotivos os mesmos direitos que os biológicos e proíbe todo tipo de preconceito contra aqueles que foram adotados, o magistrado alertou para a discrepância existente entre o número de pretendentes e o de crianças/adolescentes que estão na fila da adoção.
“Temos quase cinco vezes mais pretendentes do que crianças e isso deve ser motivo de reflexão, A razão está no fato de que a maioria das pessoas interessadas em adotar tem um padrão específico, ou seja, preferem crianças menores de 2 anos, brancas, sem qualquer enfermidade, com histórico tranquilo, e nem sempre esse é o perfil das crianças que estão disponíveis para a adoção”, asseverou.
Parafraseando o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, o poema reflexivo denominado “Criança é Coisa Séria”, o magistrado o reproduziu, na íntegra, ao finalizar a edição do curso neste mês.
“A criança é o que fui em mim e em meus filhos, enquanto eu e humanidade. Ela, como princípio é a promessa de tudo. É minha obra livre de mim. Se não vejo na criança, uma criança, é porque alguém a violentou antes e o que vejo é o que sobrou de tudo que lhe foi tirado. Mas essa que vejo na rua sem pai, sem mãe, sem casa, cama e comida, essa que vive a solidão das noites sem gente por perto, é um grito de espanto. Diante dela, o mundo deveria parar para começar um novo encontro, porque a criança é o princípio sem fim e o seu fim é o fim de todos nós”, retratou.
Consciência e responsabilidade
O curso, conduzido pela servidora e assistente social Maria Nilva Fernandes, responsável pela Divisão Interprofissional Forense da Corregedoria, está dividido em quatro módulos com temáticas afetas à adoção, com abrangência em todas as comarcas do Estado. Na edição de outubro o curso teve 239 pretendentes inscritos, com 140 participantes, e foi realizado no período noturno, das 19 às 21 horas.
Na opinião de Maria Nilva, a opção por adotar uma criança ou adolescente uma decisão exige muita consciência e responsabilidade, além de um amor aprofundado, incondicional, pelo semelhante. A seu ver, as nossas ações têm consequência direta na vida de outras pessoas e a adoção mexe com um ponto crucial que é se sentir acolhido, amado, inserido.
“A vivência de uma adoção torna indispensável a consciência manifesta de que o infante que será chamado de filho e que chamará de pai ou de mãe, deve, realmente, encontrar no interessado ou interessada a qualidade paterna ou materna sólida, presente em toda a sua extensão. Sem dúvida, o adotando percorrerá novo caminho de um nascimento ao chegar até aquele, tornando-se, de modo insofismável, o renascimento. A interação com o outro é o que enriquece o ser humano, essa troca, desse sentimento de pertencimento, de vínculo, de afeto, é essencial para a evolução e a felicidade”, ponderou.
Expositores e programação de outubro
No dia 18 de outubro, o módulo I teve como tema “Adoção, uma conta que não fecha. Por que? Perfil da criança/adolescente disponível para adoção X perfil desejado pelos pretendentes. O segundo módulo, ministrado no dia 19 de outubro, abordou O direito de voz da Criança e do Adolescente no processo de adoção e as adoções necessárias (adoção tardia, interracial, grupo de irmãos e crianças com graves e complexos problemas de saúde), enquanto o terceiro módulo chamou a atenção dos pretendentes para os mitos, verdades e preconceitos relativos à Adoção, bem como ao processo de adaptação na família adotiva.
O quarto e último módulo abrangeu o aspecto jurídico e legal da adoção como a evolução histórica desse instituto no Brasil e o Sistema Nacional de Adoção. Foram expositores desses quatro módulos os juízes Sílvio Jacinto Pereira, da 1ª Vara Cível e da Infância e Juventude da Comarca de Itumbiara, com o auxílio da Equipe Interprofissional Forense da 4ª Região; Wagner Gomes Pereira, do Juizado da Infância e da Juventude de Rio Verde, com o apoio da Equipe Interprofissional Forense da 5ª Região; Lucas Siqueira, da 1ª Vara Cível e da Infância e Juventude de Formosa, que contou com o suporte da Equipe Interprofissional Forense da 6ª Região, e Célia Regina Lara, do Juizado da Infância e Juventude de Luziânia e coordenadora adjunta da Infância e Juventude.
A secretária executiva da Coordenadoria da Infância e Juventude do TJGO, Carla de Paiva Rodrigues, também foi uma das expositoras. O evento conta ainda com o apoio da Diretoria de Planejamento e Programas da CGJGO e das equipes interprofissionais forenses de comarcas do Estado.
Formato on-line
A realização do Curso de Preparação Psicossocial e Jurídica para Pretendentes à Adoção via on-line segue a Recomendação nº 83, de 16 de dezembro de 2020, do Conselho Nacional de Justiça, que recomenda aos tribunais brasileiros o estabelecimento de critérios para a realização de audiências, avaliação da equipe interprofissional, participação em programa e/ou curso de preparação para adoção e outros atos processuais por meio de videoconferência, enquanto perdurar o estado de calamidade pública, reconhecido pelo Decreto Federal no 06/2020, em razão da pandemia mundial por Covid-19. (Texto: Myrelle Motta - Diretora de Comunicação Social da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Goiás/Edição de imagem: Acaray Martins - Centro de Comunicação Social do TJGO)